Se ele morresse
amanhã, doeria. Em quatro pessoas, uma dor que talvez nunca
fosse superada. Outras cinco sorririam só depois de um mês.
O resto, dois dias depois. Todo mundo diria: “Tão jovem. Tão
jovem.” A repetição é pra dar mais drama à
frase.
“Um jovem
sonhador, que amava a arte, amava a vida, amava amar.” O ideal
seria acrescentar depois “Pena que nunca teve oportunidade.” Mas
não fariam isso, pois suporiam estar ofendendo-o. Não
estariam. Verdade não ofende. Só machuca, e morto não
sente dor.
A verdade é
que, mesmo jovem, já devia ter vivido alguma coisa. No
mínimo... Uma. Só uma. Mesmo que fosse para sofrer. Só
pra ver se estava mesmo vivo. Era isso que desejava.
Fez uma lista de
desejos para o funeral. Queria que tocasse música boa. Músicas
muito boas. Músicas que causavam arrepios. Não queria
silêncio, não queria ouvir o barulho de lágrimas
deslizando nos rostos. Também não queria palavras bonitas no discurso
sobre ele. Queria palavrões. Queria ironia e trechos de
best-sellers.
Mas não iria
morrer. Só fez pelo tédio. Não tinha coragem nem
paciência para suicídios. Tinha coragem e paciência
somente para continuar na vida só para ver o que acontecia.
Só podia ser esse o final, de todo modo. Uns 60 anos a mais não fariam
diferença, pensou, mesmo sabendo que era idiota pensar isso. Talvez pudesse ouvir música
enquanto isso. Com muita sorte, poderia até viver...
A dor de estar
existindo de forma tão rasa estava muito bem mascarada com
risos, piadas, distrações. A noite viria, trazendo duas
lágrimas na garupa. No dia seguinte, o dia em que ele deveria
estar morrendo, releu sua lista de desejos e gargalhou. Mais tarde
choraria de novo.